O Ministério
Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) expediram
recomendação conjunta aos órgãos públicos responsáveis pela exploração
minerária para que adotem medidas coordenadas para desencadear incursão
educativa com o fim de legalização das atividades na bacia do Tapajós nas áreas
em que a exploração é admitida. Recomendam ainda que deixem de conceder
permissões de lavra garimpeira e autorizações ou licenças em áreas
reconhecidamente indígenas e de unidade de conservação de proteção integral,
como as reservas biológicas, parques nacionais, entre outros.
A
recomendação do MPF e MPPA foi expedida para o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMbio), Departamento Nacional de Produção
Mineral (DNPM), Fundação Nacional do Índio (Funai), Secretaria de Meio Ambiente
e Sustentabilidade do Estado do Pará (Semas) e Secretarias Municipais de Meio
Ambiente de Itaituba, Jacareacanga, Aveiro, Novo Progresso e Trairão.Os órgãos
destinatários da recomendação devem adotar agenda de atuação, definindo datas e
ações concretas a serem realizadas e concluídas em 90 dias. O Ministério
Público aguardará dez dias, a contar do recebimento da recomendação, para que
as instituições se manifestem acerca do acatamento, ou não, dos termos do
documento.
A
procuradora da República e os promotores de Justiça que assinam a recomendação
destacam que até o momento não há legislação infraconstitucional disciplinando
a forma especial de exploração de atividade mineral dentro de Terra Indígena e
que as normas que existem são normas constitucionais de eficácia limitada,
dependendo de normas infraconstitucionais para terem eficácia.“No cenário
jurídico atual, em razão da ausência de regulamentação do art. 231, § 3º, da
Constituição Federal, inexistem meios de efetivar a exploração de riquezas
minerais em terras indígenas, encontrando-se eventuais títulos minerários
acoimados de indiscutível nulidade”, afirmam os representantes do Ministério
Público.“Qualquer ato administrativo, seja de autorização de pesquisa mineral,
concessão de lavra mineral e permissão de lavra garimpeira, que vise a
liberação da exploração da atividade de mineração em terra indígena, não terá
validade”, ressaltam no documento.
A
Constituição Federal de 1988 afirma que a proteção territorial de populações
indígenas é requisito indispensável para a preservação de sua organização
social, costumes, línguas, crenças, tradições, além de ser indispensável para
garantir seus direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam
e de caber aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e
dos lagos existentes. Os membros do Ministério Público explicam ainda, no
documento, que as normas jurídicas vigentes no Brasil trazem especificidades da
atividade de mineração em terras indígenas, tais como como “condições
específicas”, a serem criadas por lei e que ainda não foi editada. Também é
necessária autorização pelo Congresso Nacional e a garantia da participação do
resultado da lavra das comunidades indígenas afetadas. Além disso é exigido que
haja o interesse público da União.
“O impacto
da mineração acarreta a fragmentação da territorialidade e das diversas
identidades, provocando verdadeira desestabilização da organização social de
diversas comunidades, podendo dar causa, inclusive, à extinção de comunidades
indígenas e tradições culturais”, alertam os promotores de Justiça e a
procuradora da República.
“A
inevitável degradação do meio ambiente que a mineração acarreta tem efeito
devastador para as populações indígenas, por favorecer o assoreamento e
contaminação de rios e igarapés por mercúrio, a transmissão de doenças, como
tuberculose, gripe, lepra e a mudança de hábitos tradicionais da comunidade,
como o uso de bebida alcoólica”, destacam.
E
complementam os representantes do Ministério Público: “a sobrevivência das
comunidades indígenas está acima do interesse da apropriação privada dos
recursos minerais do país, e o artigo 42 do Código de Mineração dispõe que a
autorização para exploração será recusada se a lavra for considerada
prejudicial ao bem púbico ou comprometer interesses que superem a utilidade da
exploração industrial”.“Mais importante do que combater frontalmente o problema
da mineração ilegal com uma ação pontual e isolada, a realidade local impõe a
necessidade de implementação de políticas públicas de legalização da atividade
garimpeira, pelo poder público, nas áreas em que isso é possível”, concluem.
A promotora
de Justiça Lilian Braga, uma das signatárias da recomendação, explica que, além
da fiscalização, o MPPA quer também que a mineração se estabeleça onde for
possível. “A instituição trabalha pela legalidade da mineração, nos locais onde
essa atividade possa ser legalizada, mas existem áreas que, por proibição
legal, isso não pode ser feito”.
“A
recomendação visa garantir o desenvolvimento da região. O Ministério Público
está preocupado em fomentar uma atividade sustentável e que o desenvolvimento
da região seja realizado de forma legal. Tudo legalizado e licenciado nos
lugares onde a mineração é permitida”, complementa Lílian Braga.
Assinam a
recomendação a procuradora da República Janaina Andrade de Sousa e os
promotores de Justiça Lílian Regina Furtado Braga, Ione Missae da Silva
Nakamura, Gustavo Queiroz Zenaide e Aline Janusa Teles Martins, Bruno Fernandes
Silva Freitas e Rafael Trevisam Dal Bem.
Bacia do Tapajós - A bacia do Tapajós abrange uma área
total de 199,8 milhões de hectares, no oeste do Estado do Pará, composta pelos
municípios de Itaituba, Trairão, Jacareacanga e Novo Progresso (onde se situa a
província mineral do Tapajós), Rurópolis, Belterra, Aveiro e Santarém.
A atividade
garimpeira na região de Itaituba tem importância histórica, social e econômica.
Desde a década de 50 a atividade garimpeira na região é fonte de renda de parte
da população. Segundo o DNPM, na região de Itaituba existem cerca de três mil
garimpos entre clandestinos e licenciados. Em 2011, apenas em Itaituba foram
extraídos 171,32 toneladas de ouro, com valor acumulado de R$ 113.022.699,87.
Em 2015 o total de títulos de lavra de ouro em Itaituba e Jacareacanga no DNPM
somou 465 solicitações.
O modo de
obtenção do ouro é diversificado, variando desde o método manual, sem nenhum
apoio mecânico, até o uso de máquinas pesadas, como escavadeiras e dragas,
provocando expressiva degradação ambiental.
Na região da
Bacia do Tapajós a proliferação da atividade garimpeira volta-se para o
interior das Unidades de Conservação e, neste contexto, o ICMBio, autarquia
fiscalizadora, tem papel importante. Dos 199 milhões de área explorada para
garimpo, 18 milhões estão dentro de 23 Unidades de Conservação federais que
existem na região, especialmente na Área de Proteção Ambiental (APA) Tapajós,
Florestas Nacionais (Flonas) Itaituba I e II, Parques Nacionais (Parnas)
Jamanxin, Rio Novo e Amazônia.
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