Dois meses depois do naufrágio do navio
Haidar, em Barcarena, no Pará, permanecem 3.900 carcaças de bois dentro da
embarcação, adernada no porto de Vila do Conde, contaminando a água. Vários
laudos comprovam danos sociais e ambientais provocados pelo desastre que geram
um valor mínimo de R$ 71 milhões em indenizações. O Ministério Público Federal
no Pará (MPF/PA), o Ministério Público do Estado do Pará (MP/PA), a
Procuradoria Geral do Estado e a Defensoria Pública do Estado do Pará ajuizaram
ontem, 16 de dezembro, na Justiça Federal, em Belém, ação civil pública que
pede, além do pagamento das indenizações, seja dado um prazo máximo de 48 horas
para que os responsáveis pelo naufrágio apresentem uma solução definitiva para
a retirada das carcaças.
“A demora na
retirada do óleo e das carcaças foi uma opção deliberada da empresa de
salvatagem (contratada pelos donos da carga e do navio)”, diz a ação judicial,
acusando os responsáveis de optarem, sem comunicar aos órgãos ambientais, por
esperar a carga apodrecer totalmente porque a retirada somente das ossadas é
mais barata. “Resta clara a opção preponderantemente econômica de manter a
integridade do navio em detrimento do meio ambiente, porque passados muito mais
de dois meses do acidente (que ocorreu no dia 6 de outubro), as carcaças do
deque inferior continuam mergulhadas no rio Pará”.
A maior
parte das indenizações pedidas pelos entes públicos é para reparar os danos aos
municípios de Barcarena e Abaetetuba, os mais atingidos pela contaminação. Para
Barcarena, a ação judicial pede o pagamento de R$ 35 milhões em danos. Para
Abaetetuba, o cálculo é de R$ 1,4 milhão. Em danos morais coletivos, o total
seria de R$ 20 milhões e pelos maus-tratos e crueldade com animais, os
responsáveis deverão pagar R$ 15 milhões. Os pagamentos, de acordo com os
pedidos feitos à Justiça Federal, devem ser revertidos para uma lista de
políticas públicas e investimentos a serem feitos pelos beneficiários.
Mas o valor
deve ser maior do que R$ 71 milhões, porque serão somadas as indenizações
individuais a todos os moradores da região afetados pela contaminação. Depois
do naufrágio, os odores da putrefação da carga de mais de 5 mil bois se
espalharam pela região. Foram feitos 113 atendimentos de moradores com sintomas
causados pelos odores. Ribeirinhos, pescadores e donos de barracas – a região
mais afetada foram as praias de Barcarena, destino turístico e fonte de renda
de centenas de moradores. As praias permanecem interditadas.
O cálculo
das indenizações aos moradores dependerá de cadastro dos atingidos, que, se a
Justiça concordar com os pedidos, deverá ser feito em 30 dias pelos réus da
ação. Imediatamente, a ação judicial pede que continue assegurado o fornecimento
de água potável, cestas básicas e salários mínimos a todos. Para arcar com
todos os prejuízos, os entes públicos pediram à Justiça que bloqueie contas e
bens das empresas brasileiras responsáveis pelo naufrágio.
A ação
também enumera laudos do Instituto Evandro Chagas que comprovam a contaminação
das águas do rio Pará, onde o navio afundou, pelo óleo e pela decomposição da
carga. O relatório técnico do Evandro Chagas mostra a presença de fósforo acima
dos parâmetros, contaminação por óleo e escassez de oxigênio na água,
recomendando ao final que se evite até o contato primário com as águas da
região, ou seja, não é seguro tomar banho no rio.
São réus na
ação os donos do Haidar, Husei Sleiman e Tamara Shiping, a dona da carga de
bois vivos, Minerva S.A, as responsáveis pelo embarque dos bois, Global Agência
Máritima e Norte Trading Operadora Portuária e a Companhia Docas do Pará, dona
do porto de Vila do Conde. Além da contaminação e dos extensos prejuízos
sociais e ambientais, eles são acusados de crueldade e maus-tratos com os
animais.
De acordo
com o Ministério da Agricultura, em 2014 o Brasil exportou 646 mil cabeças de
gado vivo, sendo que 95% da exportação, pelo menos 614 mil animais, saíram pelo
Pará. Os animais vêm geralmente de fazendas no sul do estado e são
transportados, ainda em terra, em péssimas condições, em caminhões fechados,
sem acesso suficiente à água e alimentação. Ao chegarem no porto, as cargas
vivas ainda suportam longas esperas até o embarque.
A ação
lembra que não é a primeira vez que a Minerva S.A, dona da carga do Haidar, foi
responsável por crueldade contra animais. Em março de 2012, 2.700 bois morreram
asfixiados por falta de ventilação dentro do navio Gracia Del Mar. Assim como o
Haidar, o Gracia Del Mar também foi adaptado para transportar bois vivos. Nos
dois casos houve violação da legislação que regula o transporte e protege o bem
estar dos animais.
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